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domingo, 23 de janeiro de 2011

Proficiências de um homem de bem.



A pontinha da caneta Bic tem desses problemas: de repente falha. O policial sacudiu feito um termômetro, riscou ágil para ver se funcionava, mas de nada adiantou. “Está perdoado dessa vez. Mas se eu te pego novamente correndo, duvido você dar essa sorte!” disse, em disciplinar repreensão. Rodrigo, agora ainda mais atrasado, agradeceu ao policial, entrou no carro e dirigiu por três quarteirões à velocidade de uma charrete, por puro sentimento de gratidão com o universo que fizera há pouco falhar a ponta da caneta Bic do guarda.

Verde, amarelo e... Vermelho: tanto o semáforo quanto o rosto suado de Rodrigo ao volante, pensando na reunião que já começara há cinco minutos sem ele. Fechou os olhos por um instante, tentando lembrar um mantra que ouviu no Discovery Chanel. Lembrou porque o som era parecido com o de um palavrão muito comum e bastante relaxante nessas horas difíceis. Riu, percebendo que naquele momento o mantra parecia menos espiritual, porém bem mais funcional. Batucou com o médio e o indicador no cano da marcha, olhando os pedestres passarem com calma pela faixa. Uma senhora com um carrinho de feira cheio de laranjas, um menino quicando uma bolinha de tênis ao lado da mãe, dois trabalhadores de obra, segurando seus capacetes azuis e uma jovem de roupas leves e curvas insinuantes, de cabelo cumprido, seios durinhos e nariz arrebitado. Sentiu-se um pouco excitado. Pensou no calor, sentiu o suor empapado na testa, a gravata apertando o pescoço... Olhou outra vez para a moça que já chegava à calçada e mais uma vez a mente voltou à reunião já começada, ao sinal ainda vermelho, ao guarda recomendando menos velocidade... E então desceu do carro ali mesmo, foi atrás da moça enquanto era tempo, correu um pouco antes que virasse a esquina, agarrou-a pelo braço, virou-a para si, quando ela espantada disse: “Doutor Rodrigo?! O que é isso?!”. Desconcertado mas segurando a postura, ele respondeu: “Luciana, você não deveria estar no escritório agora?! E a reunião?!”.

Pontinha da caneta Bic rabiscando um pedacinho de papel: Luciana, já mais calma, ria para si e reforçava a data com pontos de exclamação: “É amanhã, Dr. Rodrigo! Hoje é domingo!”.
 
Olhando Pra Grama