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quarta-feira, 24 de junho de 2009

O Fabuloso Destino de Aron



Aron, morador da Vila Buarque, magro, pálido, cabelos cacheados. Olha a vida pela janela, ajeita os óculos no rosto, enlaça o cachecol no pescoço e cospe pra fora, só pra poder se perguntar: “será que acertou alguém?” Aron tem tempo livre, mente fértil e uma puta de uma preguiça congênita. Já planejou: Montar uma sociedade alternativa no interior de Minas, onde a moeda de troca seria peixe fresco. Uma viagem à Lituânia, para conferir de perto a textura da pele das pessoas que moram em lugar frio. Ser aplaudido por milhares de pessoas gritando seu nome, num palco bem grande com as luzes todas focadas nele, e agradecer a todos pelos aplausos bem modestamente, apertando os olhos enquanto sorri, abaixando a cabeça e sacudindo a mão no ar timidamente. É bem verdade que não pensou o por que dos aplausos ou da situação, mas sente-se bem ao imaginar que um dia ela possa acontecer.

Aron, depois de cinco dias dentro de casa, tomou um banho quente, vestiu alguns agasalhos e desceu para comprar pão na padaria da esquina. Pagou a mercadoria, pegou o saco pardo e caminhou para fora do estabelecimento. Um morador de rua o parou e perguntou com ar de humildade: “o senhor poderia, por gentileza, me dar esses pães que estão aí nesse saco?”. Aron fitou o sujeito dos pés à cabeça. Ficou com o olhar vago. Depois de pensar por alguns segundos, tornou a mirar o sujeito e perguntou: “E o senhor? Não quer, ao invés disso, ir ali em casa, bem ali dobrando a rua, e tomar um café comigo? Além dos pães há alguma carne e algum queijo!”. O sujeito sorriu banguela, apertando os olhos. Sacudiu as mãos de Aron em agradecimento e os dois ganharam a rua, sentido ao apartamento. Lá tomaram café, conversaram sobre a vida, o amor, o preço da comida, as políticas de manutenção do parque do bairro, e escutaram bossa nova no tocador de vinil do Aron.

Semana seguinte, seis da manhã, solzinho gostoso batendo na pele pra quebrar o frio. O movimento das ruas do bairro ainda por começar, mas um pouco já começado. Dona Lívia, que passa pela Marquês de Itu toda manhã, admirou-se ao sentir a estranha viscosidade de um cuspe branco em sua testa. Olhou para o alto e lá na janela do Aron estava o Morador de Rua pedindo desculpas pela pontaria. Dona Lívia que não é de guardar ressentimentos disse que não havia problemas e aproveitou para perguntar por Aron. O Morador de Rua disse que seu novo amigo foi pela madrugada à Lituânia, conferir de perto a textura da pele das pessoas que moram em país frio. Aproveitou e chamou Dona Lívia para tomar um café fresquinho na cozinha de Aron. Ela foi, mas fez questão de levar alguns pães e um pouquinho de geléia de morango.


 
Olhando Pra Grama