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terça-feira, 28 de outubro de 2008
Assine-me!
Queridos amigos leitores!
Recentemente, adicionei a este blog uma ferramenta, que permite que você fique sabendo sempre que atualizo. Como o atrasado com essas tecnologias sou eu, acho que a maioria dos que entram aqui, já devem conhecer o esquema. Mas para quem ainda não sabe como é, funciona assim:
1 - Você me ama e quer meu bem.
2 - Por querer meu bem, você quer que eu fique feliz.
3 - Pra que eu fique feliz, você vai nesse ícone aí do lado escrito: "Assine-me", e adiciona meu blog a sua lista, favoritos, feed, ou o que quer que seja.
Pronto. Agora sempre que eu atualizar, você fica sabendo, e eu fico feliz.
Bonito isso, né?
segunda-feira, 27 de outubro de 2008
Próximo Passo
Certo dia ela abriu os olhos pra sair do escuro, certos olhos fecharam o escuro pra entrar no dia, certos escuros fecharam o dia pra entrar nos olhos. Paralelamente, Eliete, a empregada, abria a persiana, cutucando Lúcia com o espanador de pó.
- Dona Lúcia, ta tudo bem?...
-Tudo bem, Eliete, foi só um sonho...
Eliete leu na revista que os sonhos podem nos dizer coisas, muito além dos números premiados do jogo do bicho. Leu que temos uma tal de “percepção”, que capta coisas sem nos darmos conta.
- Mas foi tão estranho, Eliete... Eu estava deitada em minha cama, no meio da calçada. A cidade estava totalmente vazia, quando, de repente, o silêncio foi quebrado por um desfile, que vinha em minha direção. Todos vestidos com roupas lindas, exóticas, com carros alegóricos gigantescos...
Eliete sentou-se na pequena poltrona, que ficava ao lado da cama. Juntou as pernas, joelho com joelho, repousou o espanador sobre os mesmos, subiu os óculos para o topo do entre olhos, e disse serenamente:
- Conte-me mais, Dona Lúcia...
Lúcia desfaleceu-se novamente, como se tivesse resolvido voltar ao sono. Reclinou a cabeça sobre o travesseiro e continuou:
- Quando reparei melhor nos carros, cada um deles continha algo que sempre quis. O primeiro tinha uma casa muito bonita, com muitas pessoas dentro, aparentemente amigos, com clima de felicidade e aconchego...
- Bom... – disse Eliete, agora apoiando a cabeça sobre as pontas dos dedos polegar e indicador. Lúcia deslizou os cinco dedos de sua mão direita, como um pente, para dentro de seus cachos loiros, e, depois de um suspiro profundo e inquietante, prosseguiu novamente:
- O segundo carro... Não sei ao certo, mas pareciam-me pessoas sentadas num sofá de uma sala... Não consegui ver seus rostos, mas o estranho é que senti que os amava muito. Havia um lugar vazio ao lado do mais alto deles... Já o terceiro carro foi o mais estranho. Sobre um altar, um enorme coração vermelho, flutuando, preso a uma corda, feito um balão. Quando este passou frente à minha cama, na qual, apesar de tão estranha manifestação, eu ainda continuava deitada, parou com todo o resto do desfile. Do carro, desceu um senhor com uma longa barba branca, e olhos indiscutivelmente sábios. Ele me disse: “Lúcia, tudo isso é seu. Você merece, não discuto. Mas sabe, Lúcia? Nada na vida é assim tão fácil... Você tem que saber pegá-los, querida”. Então, sem muita empolgação, levantei-me lentamente, fiquei sentada, de pernas cruzadas na cama, e olhando pra ele, perguntei: “Senhor... Basicamente o que tenho feito a vida inteira, é correr atrás de tudo isso. Caso saiba o caminho, seria boa idéia, e de muita gentileza, que me falasse agora. Por favor, algo a dizer?...”. Então e velhinho de roupas antigas – belas roupas, Eliete, mas antigas -, retirou do carro uma caixa e entregou com carinho em minhas mãos. “Lúcia, tudo é uma questão de paciência, e, também, de uma empírica sapiência... Tens que saber que o que passou, já passou... Que o que não aconteceu, acredite, filha, não tinha que acontecer. O lamento tem seu valor, mas tens que decidir, querida jovem, o que vem agora. A vida está no sentido horário.”.
A essa hora, Eliete, que antes estivera com toda uma pose e formalidades de ofício, encontrava-se, agora, com os olhos bem arregalados, ansiosos pelas próximas palavras. Lúcia virou-se para janela, onde a visão não encontrava Eliete, e perguntou:
- Estou te incomodando, querida?
Eliete realinhou-se na hora, pigarreou, esticou a coluna e projetou com voz sábia e condescendente:
- Não, Dona Lúcia, prossiga, por favor.
Então Lúcia fechou os olhos, trouxe o edredom para mais perto do pescoço e disse:
- Enfim... Dentro da caixa havia um celular moderno, que contrastava muito com o clima daquilo tudo... Quando o liguei, havia somente o número do Márcio. Sabe, Eliete, ele já não me liga há semanas... Gosto dele, mas sei que não vai dar em nada... A gente quer se proteger, e tudo mais, porém acaba sempre fazendo a coisa errada, e perdendo tempo com copos furados, não é mesmo?... Como de costume, era isso mesmo o que eu iria fazer. Quando aproximei meu polegar do botão de chamada, estava de olhos fechados, fluindo pequenas lágrimas, de coração apertado, sabendo que não deveria fazer aquilo... De repente escutei um barulho estranho, de vários passos e movimentos, abri os olhos, e todas as pessoas do desfile, todos em minha volta, olhando-me fixamente, alguns em janelas de prédios, outros em monumentos, outros pendurados em postes e árvores, e todo o resto de pé na rua, e um clima estranhíssimo de expectativa! Olhei para o celular, olhei para eles, levantei-me e fiz silêncio por um minuto.
- E então, Dona Lúcia?! – perguntou Eliete, já em pé e de olhos quase caindo para fora do rosto.
- Fiz o contrário. Larguei o celular na cama, desci da mesma, e enquanto todos abriam espaço para a minha passagem, e aplaudiam-me fervorosamente, caminhei rumo ao horizonte, com a certeza de que estava, realmente, satisfeita... As pessoas sumiram, o desfile também, e só o que ficou foi um relógio em meu pulso, sem nenhum de seus ponteiros...
Nessa hora Lúcia virou-se novamente, sentou-se à beira da cama, olhou para Eliete, e recortou um amistoso sorriso em seu rosto.
- E então, Eliete, o que você acha? Piração, né? Hahaha!
Eliete, um pouco desconcertada, riu-se toda, olhando para os lados. Então, relaxando os ombros, falou:
- Ai Dona Lúcia, sei não... Mas se for pra jogar no bicho, acho que a senhora deveria jogar na águia, viu...
quinta-feira, 23 de outubro de 2008
A Íntima Luta
Havia acabado de almoçar, e as minhocas da preguiça já amaciavam a carne do meu corpo. Afofavam os músculos, os ossos, pesavam-me as pálpebras, e provocavam-me bocejos profundos e espirituais. A pele já havia transformado-se numa gosma, feito sagu hidratado, e eu não conseguia fazer distinção do que era corpo, e poltrona. Ah... E que poltrona. Macia, delicada, aconchegante, azul. Não demorou muito para o Diabo começar a dar leves empurrões, pouco acima da minha nuca. Minha cabeça caía, minhas pálpebras fechavam, meu corpo entrava, então, em estado de reparo, cercado por fitas imaginárias com o dizer “fechado para descanso”. Com tudo, havia um senhor de rosto enrugado, terno antigo, e olhar muito lúcido, atolado em um mar de neve, agredido pelo vento frio, com uma única e minúscula vela acesa: era minha consciência, meu lado racional, mostrando-me que ele ainda existia. Embora todos ao seu redor estivessem a blaterar, mandando meter-se com sua vida, ele continuava lá, e sua luz crescia cada vez mais. Dentro de um pequeno tempo, as expressões de espanto de todo o organismo, já não eram suficientes para deter a incrível luz que aumentava em progressão geométrica, alcançando, então, um clarão totalitário, feito uma cegueira. Aquilo me fez abrir repentinamente os olhos, por demais – admito - assustados, suspirar profundamente, e dizer para mim mesmo: “Não tem jeito, camarada, é melhor levantar e ir escovar os dentes...”.
quinta-feira, 2 de outubro de 2008
Dois Mini Contos
Em câmera lenta, ele tateava com o olhar cada saliva, cada gotícula de cúspe que saia por entre os dentes amarelados e sujos do público na arquibancada. Gordos e rosados, eles gargalhavam, apontavam, lacrimejavam e entupiam-se com seus próprios ângulos. Desta vez o palhaço resolveu ficar parado e, olhando o público, esperou que cada um se calasse, para então dizer em som elevado, porém de forma seca e potente, a seguinte e sintética frase: "a vida, senhores, é bem mais que uma piada.".
Pegou suas coisas, e, ainda maquiado, rumou de bicicleta para a cidade vizinha, onde lavou pratos, fumou cigarros, e comeu verduras pelo resto de sua vida. Contente, todo dia antes de dormir ele lembra que, infelizmente, ainda não está acordado.
Procura
Já estava decidido. Sentei na cadeira de madeira antiga, frente à escrivaninha, peguei o bisturi e comecei a abrir meu peito. Quando já era o buraco suficientemente grande, deslizei minha mão direita para dentro do lado esquerdo, e comecei a apalpar cada órgão com cuidado e delicadeza. Inspecionei cada espaço, cada fresta, cada baixo relevo, ou diferente textura. Retirei minha mão completamente vermelha. Um vermelho vivo, que brilhava. Foi do brilho que tirei a conclusão: o que eu estava procurando tinha que estar perto. Passei o bisturi de têmpora a têmpora, como quem abre um enlatado, retirei todo o tampo craniano e inspecionei novamente, só que com as duas mãos agora. Vasculhei por cima, pelos lados, debaixo do cérebro, e nada. Nem sinal da coisa. Levantei-me então e passei o bisturi por todo o resto do corpo. Braços, pernas, garganta, genitália. Coloquei órgão por órgão, e todos os músculos, em cima da escrivaninha, de modo que só sobraram-me os ossos. Suspenso apenas pelo espírito, caminhei até o banheiro, prostrei-me ao chuveiro quente, e esperei que fosse junto com a água, todo o sangue que ainda havia. Em seguida, pus todos os ossos organizadamente empilhados dentro da banheira, estiquei bem a pele, fui até a varanda, passei-a com o ferro no ponto certo. Estendi-a no varal, pegando o solzinho da manhã, e fui invisível pra frente do espelho. Deu muito trabalho, mas lá estava ele, finalmente! Vermelho, brilhante, pulsando como uma estrela... O amor, meu amigo, certamente não é físico.